Reflexão do dia:

Reflexão da semana

"Ser de Candomblé não se limita ao fato de ter uma religião, é, sobretudo, um modo de vida".
Pai Lucas de Odé

segunda-feira, 14 de março de 2016

O dinheiro no Candomblé: Enquanto uns vendem ilusões outros negociam a fé

Por Pai Lucas de Odé*

A história de diferentes pessoas ao chegarem no Axé Dambá Odé me levaram a escrever este texto. Quero falar sobre o dinheiro e as relações entorno dele no meio religioso, mas especificamente no Candomblé.

O “vil metal” não é chamado assim por acaso. Quando o homem descobriu o metal, logo passou a utilizá-lo para fabricar seus utensílios e armas anteriormente feitos em pedra. Mitologicamente, essa é uma das atribuições que fez de Ogun – o orixá da forja – um dos mais revolucionários entre os Orixás.

Surgiram, no século VII a.C., as primeiras moedas com características semelhantes às que conhecemos hoje. Pequenas peças de metal com peso e valor definidos e com a impressão do cunho oficial, atestado de que quem as emitiu e garante o seu valor.

O mundo antes do dinheiro funcionava por meio da cooperação entre as pessoas. O chamado escambo.  Simples trocas de mercadoria por mercadoria, sem equivalência de valor, de acordo com as necessidades fundamentais dos membros de uma comunidade. É claro que o mundo não podia continuar assim. Algumas mercadorias tinham mais utilidade que outras, logo eram mais procuradas e sobressaíram em valor, como pressupõe a lei da oferta e da procura.

O sal foi uma das moedas-mercadoria mais significativas para as civilizações, tanto que referimo-nos até hoje aos nossos salários. Era difícil de conseguir e muito utilizado na conservação de alimentos. No Brasil, entre outras mercadorias, circularam o cauri (búzios) – trazido pelo escravo africano –, o pau-brasil, o açúcar, o cacau, o tabaco e o pano, trocado no Maranhão, no século XVII.

E pra que toda esta introdução? Simples: pra comprovar que historicamente o dinheiro afastou as pessoas umas das outras, as fez querer levar vantagem umas sobre as outras e, por fim, porém não menos importante, como diz meu pai: que “o dinheiro afasta as pessoas de Deus”.

Se trouxermos esse aparato histórico para o seio dos nossos terreiros de Candomblé, uma série de pensamentos me vêm à mente. A fé pode ser suprida pelo dinheiro? A quantidade suprime a qualidade? O luxo representa o melhor nesse processo de religação que buscamos? Pra todas essas perguntas, uma única resposta: Não!

O Candomblé é uma religião baseada na obtenção e transmutação do Axé, força vital sagrada, sem forma, sem raciocínio, que buscamos por meio de ritos e conservamos por meio de padrões comportamentais. Nesse contexto, o dinheiro pode arcar com a maior das oferendas, mas não pode substituir o processo de preparo delas todas e o Axé, creiam, não está no fim, mas no meio deste produto. Sendo assim, pagar outros para fazerem por você ou querer compensar sua falta com recursos financeiros não te traz Axé. Não adianta se iludir. Deus gosta de zelo, de culto... é a devoção que nos liga a Ele. É o suor, a noite de sono perdida, o desprendimento da energia do corpo em forma de trabalho pelo sagrado.

Ao meu ver, a maior das lições precisa ser dada aos próprios sacerdotes do Candomblé. Não foi só o branco de classe média que estragou o idealismo religioso do povo mais simples. A corrupção vem do maior para o menor e, neste cenário, em se tratando sobretudo de uma religião hierárquica, quem mais deveria ter critérios se corrompeu. Concessões, facilidades, regalias, meias verdades, tudo visando apenas o dinheiro. “Ganha-se dos errados para bancar o certo”, dizem alguns. Ledo engano. Se assim um Babalorixá ou Iyalorixá o fez, passou ele ou ela a ser o errado.

É fato que num terreiro de Candomblé existem despesas e essas não são pequenas. Precisamos como todo mundo precisa do dinheiro, uma vez que a lógica do capital não nos permite retroagir. Contudo, vender ilusões, trocar valores morais por valores em reais é o pior dos pecados.

Como proceder? A verdade sempre é o melhor caminho. No Dambá Odé, a minha concepção de religioso me obriga a ser o mesmo pai para os pobres e para os ricos. A bênção não pode ser comprada. Ela tem que ser conquistada.

Acreditar está além do que se pode ver. Quantas histórias já ouvi... quantas vezes consegui muito com pouco, dividi e divido o que ganho na minha vida particular com o que creio ser sagrado. No momento em que abro as portas da minha casa para receber pessoas no que chamo de templo, não posso permitir que alguém saia sem uma ajuda. Creiam, poucas vezes vi conseguirem muito com muito. Um prato vazio pode ser a mais especial das oferendas para quem só tem a sí mesmo para ofertar.

*Pai Lucas de Odé é Babalorixá do Axé Dambá Odé, localizado em São Bernardo do Campo - SP.

5 comentários:

  1. DESDE QUANDO CANDOMBLÉ E ORTODOXO, KKKKKKKKK SO RINDO MESMO NE, CADA UMA, EXPLICA ISSO MELHOR RAPAZ

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Ortodoxo é aquele que segue fielmente um princípio, uma norma ou uma doutrina. Do grego “orthos” que significa “reto” e “doxa” que significa “fé”. É o que está em conforme com a doutrina religiosa tida como verdadeira.


      Ortodoxo é uma expressão usada para fazer referência a algo rígido, tradicional, que não evolui, que é conservador, que não se adapta nem admite novos princípios ou novas ideias. É aquele que está em conformidade com os princípios tradicionais de qualquer doutrina.

      Excluir
    2. Ortodoxo é aquele que segue fielmente um princípio, uma norma ou uma doutrina. Do grego “orthos” que significa “reto” e “doxa” que significa “fé”. É o que está em conforme com a doutrina religiosa tida como verdadeira.


      Ortodoxo é uma expressão usada para fazer referência a algo rígido, tradicional, que não evolui, que é conservador, que não se adapta nem admite novos princípios ou novas ideias. É aquele que está em conformidade com os princípios tradicionais de qualquer doutrina.

      Excluir
    3. Ignorante foi tentar desmerecer o conhecimento alheio e passou vergonha.

      Excluir
  2. Então posso dizer que o dinheiro se faz presente e necessário na religião assim como nas outras?

    ResponderExcluir

Obrigado pela sua participação! Axé!!!