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"Ser de Candomblé não se limita ao fato de ter uma religião, é, sobretudo, um modo de vida".
Pai Lucas de Odé

quinta-feira, 3 de março de 2011

Ogum dá aos homens o segredo do ferro

Itàn - Lendas:

Ogum dá aos homens o segredo do ferro

Na terra criada por Obatalá, em Ifé,
os orixás e os seres humanos trabalhavam e viviam em igualdade.
Todos caçavam e plantavam usando frágeis instrumentos
feitos de madeira, pedra ou metal mole.
Por isso o trabalho exigia grande esforço.
Com o aumento da população em Ifé, a comida andava escassa.
Era necessário plantar uma área maior.
Os orixás então se reuniram para decidir como fariam
para remover as árvores do terreno e aumentar a área da lavoura.
Ossaim, o orixá da medicina, dispôs-se a ir primeiro
e limpar o terreno.
Mas seu facão era de metal mole e ele não foi bem sucedido.
Do mesmo modo que Ossain,
todos os outros orixás tentaram,
um por um, e fracassaram
na tarefa de limpar o terreno para o plantio.
Ogum, que conhecia o segredo do ferro, não tinha dito nada até então.
Quando todos os outros orixás tinham fracassado,
Ogum pegou seu facão, de ferro, foi até a mata e limpou o terreno.
Os orixás, admirados, perguntaram a Ogum de que material
era feito tão resistente facão.
Ogum respondeu que era o ferro,
um segredo recebido de Orunmilá.
Os orixás invejavam Ogum pelos benefícios que o ferro trazia,
não só à agricultura, como à caça e até mesmo à guerra.
Por muito tempo os orixás importunaram Ogum
para saber do segredo do ferro,
mas ele mantinha o segredo só para sí.
Os orixás decidiram então oferecer-lhe o reinado
em troca de que ele lhes ensinasse
tudo sobre aquele metal tão resistente.
Ogum aceitou a proposta.
Os humanos também vieram a Ogum
pedir-lhe o conhecimento do ferro.
E Ogum lhes deu o conhecimento da forja,
até o dia em que todo caçador e todo guerreiro
tiverem sua lança de ferro.
Mas, apesar de Ogum ter aceitado o comando dos orixás,
antes de mais nada ele era um caçador.
Certa ocasião, saiu para caçar e passou muitos dias fora
numa difícil temporada.
Quando voltou da mata, estava sujo e maltrapilho.
Os orixás não gostaram de ver seu líder naquele estado.
Eles o desprezaram e decidiram destituí-lo do reinado.
Ogum se decepcionou com os orixás,
pois quando precisaram dele para o segredo da forja,
eles o fizeram rei
e agora diziam que não era digno de governá-los.
Então Ogum banhou-se,
vestiu-se com folhas de palmeira desfiadas,
pegou suas armas e partiu.
Num lugar distante chamaro Irê, construiu uma casa
embaixo da árvore de akokô e lá permaneceu.
Os humanos que receberam de Ogum o segredo do ferro
não o esqueceram.
Todo mês de dezembro, celebram a festa de Iudê-Ogum.
Caçadores, guerreiros, ferreiros e muitos outros
fazem sacrifícios em memória de Ogum.
Ogum é o senhor do ferro para sempre.

Fonte: PRANDI, Reginaldo, Mitologia dos Orixás - São Paulo: Companhia das Letras,2001.

Comentário: Esse mito nos oferece várias possibilidades de fazer alusão ao que praticamos no cotidiano de nossas casas de candomblé. Conforme o mito narra, Ogum antes de tudo era caçador. Isso me remete a uma expressão freqüente, com a qual saudamos Ogum. Entre tantas outras dizemos a Ogum "AKÀN BI ODÉ", o que significa "o primeiro caçador".

Existem outros mitos que narram que foi Ogum quem transmitiu a Oxossi/Odé os segredos da prática da caça, o que reforça outra vez o uso da expressão.

Literalmente, no idioma Yorubá, akàn significa caranguejo, mas é uma palavra utilizada no yorubá para significar "bom",assim como "peixe" é usada para designar "mau". Ex: "eja mbi akàn?" - isto é bom ou mau? "Akàn ni" = isto é bom.

Akàn também refere-se a um ornamento (dragona) usado nos ombros pelos oficiais. Já Akán, significa ligeireza, elegância, atividade.

Quanto a parte do mito que diz que Ogum refugiou-se para debaixo da árvore de akoko e vestiu-se de folhas de palmeira desfiadas, primeiramente, na África (em Irê), os assentamentos de Ogum são depositados debaixo da mesma árvore, sendo o akoko uma folha de Ogum e Ossaim.

Quanto as folhas de palmeira desfiada, o mariwò - muito usada nas casas de candomblé -, diversas cantigas de rum de Ogum, principalmente as tocadas em OGÈLÈ (ritmo da Sassain) fazem referência ao fato de Ogum se vestir de mariwò.

Sobretudo, o mito ainda transmite a nós um alerta quanto a decepções que nós sacerdotes sofremos, depois de ajudar aqueles que, por ventura, nos procuram, são atendidos e depois "esquecem" da ajuda prestada. Todo mito, além de explicar ou justificar atos, traz intrínseco uma lição para nós.

Essas são as minhas interpretações do mito acima, baseada no conhecimento que me foi transmitido ao longo de minha vida sacerdotal. Espero que nossos amigos e irmãos colaborem também. Espero, mais uma vez, ter sido útil. Atenciosamente, Pai Lucas de Odé.

Um comentário:

  1. Ògún pèlé o !
    Ogum, eu te saúdo !
    Ògún alákáyé,
    ògum, senhor do universo,
    Osìn ímolè.
    loder dos orixás.
    Ògún alada méjì.
    Ogum, dono de dois facões,
    O fi òkan sán oko.
    Usou um deles para preparar a horta
    O fi òkan ye ona.
    e o outro para abrir caminho.
    Ojó Ògún ntòkè bò.
    No dia em que Ogum vinha da montanha
    Aso iná ló mu bora,
    ao invés de roupa usou fogo para se cobrir.
    Ewu ejè lówò.
    E vestiu roupa de sangue.
    Ògún edun olú irin.
    Ogum, a divindade do ferro
    Awònye òrìsà tií bura re sán wònyìnwònyìn.
    Orixá poderoso, que se morde inúmeras vezes.
    Ògún onire alagbara.
    Ògún Onire, o poderoso.
    A mu wodò,
    O levamos para dentro do rio
    Ògún si la omi Logboogba.
    e ele, com seu facão, partiu as águas em duas partes iguais.
    Ògún lo ni aja oun ni a pa aja fun.
    Ogum é o dono dos cães e para ele sacrificamos.
    Onílí ikú,
    Ogum, senhor da morada da morte.
    Olódèdè màríwò.
    o interior de sua casa é enfeitado com màríwò.
    Ògún olónà ola.
    Ogum, senhor do caminho da prosperidade.
    Ògún a gbeni ju oko riro lo,
    Ogum, é mais proveitoso ao homem cultuá-lo do que sair para plantar
    Ògún gbemi o.
    Ogum, apoie-me
    Bi o se gbe Akinoro.
    do mesmo modo que apoiou Akinoro.

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