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"Ser de Candomblé não se limita ao fato de ter uma religião, é, sobretudo, um modo de vida".
Pai Lucas de Odé

quinta-feira, 7 de abril de 2011

O Candomblé chorou... e ...

Por Pai Lucas de Odé

Em novembro de 2006 o anime "Yansan" de Carlos Eduardo Nogueira faturou o título de melhor filme do 14 Anima Mundi, entre outros prêmios. A princípio fiquei contente por ver minha religião ganhar projeção como produto de um festival mundial de animação.

Oyá - como também é chamada devido a um rio situado na Nigéria - é DIVINDADE (observe-se o peso da palavra) dos ventos, das tempestades. Conta a mitologia Yorubá que foi a primeira das esposas de Xangô e tinha como característica um temperamento impetuoso.

O itã (lenda) conta que Xangô enviou-a em missão na terra dos Baribás, afim de buscar um preparado que, uma vez ingerido, lhe permitiria lançar fogo e chamas pela boca e pelo nariz. Oyá, desobedecendo as instruções do esposo, esperimentou esse preparado, tornando-se também capaz de cuspir fogo, para grande desgosto de Xangô, que desejava guardar só para sí este terrível poder.

Oyá foi, no entanto, a única das mulheres de Xangô que, ao final do seu reinado, seguiu-o na sua fuga para Tapá. E, quando Xangô recolheu-se para baixo da terra, em Kossô, ela fez o mesmo em Irá.

Antes de se tornar mulher de Xangô, Oyá tinha vivido com Ogum. A aparência do Deus do ferro e dos ferreiros causou-lhe menos efeito que a elegância, o garbo e o brilho do Deus do trovão. Ela fugiu com Xangô, e Ogum, enfurecido, resolveu enfrentar o seu rival; Mas este último foi à procura de Olodumarè, o Deus supremo, para lhe confessar que havia ofendido Ogum. Olodumarè interveio junto ao amante traído e recomendou-lhe que perdoasse a afronta. E explicou-lhe: "Você, Ogum, é mais velho do que Xangô! Se, como mais velho, deseja preservar sua dignidade aos olhos de Xangô e aos dos outros Orixás, você não deve se aborrecer, nem brigar; deve renunciar a Oyá sem recriminações". Mas Ogum não foi sensível a esse apelo, dirigido aos sentimentos de indulgência. Não se resignou tão calmamente assim, lançou-se à perseguição dos fugitivos e trocou golpes de várias mágicas com Oyá, que foi então, dividida em nove partes. Este número nove, ligado a Oyá, está na origem de seu nome Yansan encontramos esta referência no ex-Daomé, onde o culto de Oyá é feito em Porto Novo, sob o nome de Avesan, no bairro Akron (Lokoro dos Yorubás) e sob o de Abesan, mas ao norte, em Baningbê. Esses nomes teriam por origem a expressão ABORIMESAN ("com nove cabeças"), alusão aos supostos nove braços do delta do Níger.

Uma outra indicação da origem deste nome nos é dada pelo itã da criação da roupa de Egungun (espírito ancestral) por Oyá. Roupa sob as quais, em certas circunstâncias, os mortos de uma família voltam à terra a fim de saudar seus descendentes. Oyá é o único Orixá capaz de enfrentar e de dominar os Egungun.

Oyá lamentava-se de não ter filhos. Esta triste situação era consequência da ignorância a respeito das suas proibições alimentares. Embora a carne de cabra lhe fosse recomendada, ela comia a de carneiro. Oyá consultou um Babalawo ("pai do segredo"), que lhe revelou o seu erro, aconselhando-a a fazer oferendas, entre as quais deveria haver um tecido vermelho. Este pano, mais tarde, haveria de servir para confeccionar as vestimentas dos Egungun. Tendo cumprido esta obrigação, Oyá tornou-se mãe de nove crianças, o que se exprime em Yorubá pela frase: "iyá omo mesan", origem de seu nome Iyansan.

Quanto ao seu outro nome Oyá, há uma lenda que faz alusão à sua origem, explicando-a por um jogo de palavras. Nela se conta "como uma cidade chamada Ipô estava ameaçada de destruição, envadida pelos guerreiros Tapás. Para preservá-la foi feita uma oferenda das roupas do rei dos Ipôs. Este traje era de tal beleza que as galinhas do lugar puseram-se a cacarejar de surpresa - razão pela qual - diz-se gravemente na lenda, as galinhas cacarejam até hoje, sempre que estão em presença de qualquer coisa estranha. Este prestigioso traje foi rasgado (Yá) em dois para servir de almofada de apoio às cabaças de oferendas. Apareceu então, misteriosamente, uma água que se espalhou (Yá), inundando os arredores da cidade e afogando os agressores Tapás. Quando os habitantes de Ipô procuraram um nome para este rio que surgiu e se espalhou, Yá, quando as roupas foram rasgadas, Yá, decidiram chamá-lo Odò Oyá.

Existe uma lenda, conhecida na África e no Brasil, que explica de que maneira os chifres de búfalo vieram a ser utilizados no ritual do culto de Oyá-Yansan:

"Ogum foi caçar na floresta. Colocando-se à espreita, percebeu um búfalo que vinha em sua direção. Preparava-se para matá-lo quando o animal, parando subitamente, retirou a sua pele. Uma linda mulher apareceu diante de seus olhos. Era Oyá-Yansan. Ela escondeu a pele em um formigueiro e dirigiu-se ao
mercado da cidade vizinha. Ogum apossou-se do despojo, escondendo-o no fundo de um depósito de milho, ao lado de sua casa, indo, em seguida, ao mercado fazer a corte à mulher-búfalo. Ele chegou a perdir-lhe em casamento, mas Oyá recusou-se inicialmente. Entretanto, ela acabou aceitando, quando, de volta à floresta não mais achou a sua pele. Oyá recomendou ao caçador não contar a ninguém que, na realidade, ela era um animal. Viveram bem durante alguns anos. Ela teve nove crianças, o que provocou o ciúme das outras esposas de Ogum. Estas, porém, conseguiram descobrir o segredo da aparição da nova mulher. Logo que o marido se ausentou, elas começaram a cantar: "má gje, má mu, awo re nbe ninú aká", "você pode comer e beber (e exibir a sua beleza), mas a sua pele está no depósito (você é um animal)".

"Oyá compreendeu a alusão; encontrando a sua pele, vestiu-a e, voltando à forma de búfalo, matou as mulheres ciumentas. Em seguida, deixou os seus chifres com os filhos, dizendo-lhes (em caso de necessidade, batam um contra o outro, e eu virei imediatamente em vosso socorro). É por essa razão que chifres de búfalos são sempre colocados nos locais consagrados a Oyá-Yansan".

A mitologia Yorubá é carregada de significados e simbolismos. Trata-se de uma cultura de grande riqueza, além de ser milenar.

Revoltei-me quando assisti o anime "Yansan". Ví uma total falta de conhecimento acerca da mitologia Yorubá. Por isso fiz questão de digitar letra a letra os itã mencionados no curta metragem para que o leitor possa valer-se do seu senso crítico com mais propriedade.

O candomblé é uma religão animista, das mais antigas do mundo. Confesso que os traços do filme são bem feitos, mas os estereótipos atribuídos aos personagens são de total mau gosto, além de estarem impregnados de vulgaridade.

Lamento profundamente o desconhecimento, lamento a ignorância, lamento o despreparo, lamento o preconceito, lamento a injustiça, lamento tudo que foi mostrado neste vídeo depreciativo e mal-intencionado.

Essa difamação foi muito disseminada pelo mundo. Tantas pessoas, assim como eu, trabalham, estudam e se preparam por anos e anos para levar para o horizonte as belezas do candomblé, e repentinamente sem qualquer conhecimento de causa um diretor nos derruba como a uma formiga que sobe pela parede. Lamento...

mais informações sobre a injúria taxada de filme no endereço:http://www.stoneagescanners.com/edu/yansan/ para ver o vídeo acesse: http://www.portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=4839

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